terça-feira, 23 de março de 2010

Ditadura?





Nenhuma ditadura sobreviveu. Nenhuma ditadura sobreviverá. O desejo humano pela liberdade sempre se sobreporá à pequenez dos falsos líderes, daqueles que acreditam que a melhor forma de gerenciar é impondo ideias, tolhendo a capacidade inata de cada um de elaborar percepções.

Mas, sim, algumas ditaduras ainda vigoram, a do consumismo desmedido, a do corpo desenhado, a supervalorização da juventude, ou melhor, da depreciação da velhice. A ditadura da corrupção e da imoralidade, que se reflete na represália covarde daqueles que defendem os princípios constitucionais e o ordenamento jurídico. A ditadura do silêncio, que cerceia tacitamente a falar sobre o que ninguém quer falar por medo, medo e vergonha de si mesmo.

A ditadura militar não é mais do nosso tempo. Já era. Pertence a uma outra época. Passou. Ela foi a grande responsável pelo esforço coletivo em concretizar o direito de contradizer, de argumentar, de participar, de reunir, de expressar, de escrever, de cantar, de dizer, de votar. Uma vez conquistados tais direitos, o processo histórico volta-se para a conquista de outros que venham a complementar o exercício da dignidade humana.


Há sim, certo saudosismo presente na fala e na postura daqueles que não sabem falar de democracia e direitos humanos sem olvidar daquele governo ditador. Há sim extemporaneidade no discurso pretérito sobre épocas que, como já disse, não sobreviveram, nem nunca sobreviverão. Pois, há muito o que se falar do tempo em que estamos. Todavia, deixa-se de costurar os novos caminhos da história, com novos debates, novas divergências, novas argumentações, para paralisar noutra era, para se alimentar de um ponto de partida ultrapassado.

Enquanto isso, a modernidade medieval dos direitos sociais, culturais e econômicos desbotam cada vez mais nos semblantes preocupados com o porvir de um tempo que já foi. Não que não seja importante rediscutir a história, mas é que a ditadura militar dificilmente sai da pauta da discussão dos direitos humanos para dar espaço para temáticas futuristas. É, porque tá tão difícil falar sobre educação, saúde, direitos trabalhistas, moradia, proteção à maternidade e à infância, que estes já viraram temas pertencentes às sociedades de outros planetas.

domingo, 21 de março de 2010

Lealdade


Ser leal é ser sincero, dedicado, fiel, é assumir o compromisso de respeitar o outro. É não querer ver a pessoa objeto de nossa proteção ser alvo das línguas malsãs, tampouco seremos nós mesmos proprietários destas.

Ser leal é falar a verdade com amor, com o desejo sincero de ver uma perspectiva melhor para aquele que a ouve, é também deixar de falar a verdade, na medida correta, não é mentir, é salvaguardar.

A lealdade é gênero, a fidelidade espécie. A lealdade é ampla, abstrata, complexa, a fidelidade é exata, moldada, quase imposta. A lealdade é automática, advém naturalmente da sublimidade dos nobres sentimentos, a fidelidade é pactual, raciocinada, engessada.

Na guerra das virtudes para eleição de qual delas é a suprema, a lealdade atinge patamar específico, inabalável. É o sentimento que sustenta todos os outros, que freia, que incentiva, e conduz ciclicamente ao amor ou a própria manifestação deste.

E por aí vamos, nos julgando humanos, espertos, inteligentes, astutos, viris, verdadeiros símbolos da evolução, quando na verdade conhecemos como ícone da lealdade o cão, através de diversas histórias de devoção e compromisso. “O cão é o melhor amigo do homem”, dizem uns, “lealdade é qualidade de cachorro que nem todas as pessoas têm”, dizem outros. O que não nos reduz a uma condição inferior, e sim faz confirmar que ainda estamos aprendendo a nos tornar seres humanos.

Todos queremos ser objeto da lealdade de alguém, mas quantas e quantas vezes exigimos uma incodicionalidade de amor que desconhecemos sentir...mas sempre estamos lá com requerimentos irrestritos, como déspotas.

“Serei, serei leal contigo...”, é a promessa cantada por Caetano. Seja real.