sexta-feira, 22 de agosto de 2008

luta sangrenta pela paz - Clarice Lispector


"Não somos nós que somos cruéis, a vida é que é, e nós somos os elementos vitais dessa vida, e não se chama crueldade viver a vida. (...) Sei que as coisas são complicadas. Mas são ao mesmo tempo simples. Elas se complicam à medida em que se tem medo da simplicidade - porque essa simplicidade seja o fato em si, a verdade. Encare um pouco a verdade, que é muito bonita, e sinta-se livre, querida."
MINHAS QUERIDAS - Clarice Lispector

Sétimo dia




Volta naqueles dias em que o pintor
Mostrou-lhe a vida e disse que ele era livre
Cada pedaço de chão que passou
Diz que nunca soube nem saberá colher flores
Não pode, não consegue conter sua cólera
A dor sobressalta de seus pulsos
Como jogar fora ?
Brinca com as profecias que cuida de criar
Seus frutos estão com as sementes podres
E já não servem mais...
E a ele lembrará de como éramos inocentes
em acreditar que o amor pode salvar
E a ele pedirá para falar e maldizer nossas leis
Para confortar
Mas isso não vai acontecer
Só quer se privar de vê-lo ao longe
Mas ele nunca esteve aqui

quinta-feira, 21 de agosto de 2008

Resistente


Vejo os destroços daquela guerra civil
Gente da gente caindo num abismo inobservável
E num futuro distante e não tão distante assim
Vejo as ruínas de estrelas sem limpidez
E há templos carentes de fé
Escute bem o que eles dizem
E não faça nada além do certo
se o certo é somente não saber o que fazer
Teu emblema no peito não me faz prestar continência
Porque o futuro é simplesmente amor
Quando, então, seremos ricos...

sábado, 9 de agosto de 2008

Ensaio sobre a hipocrisia


Belas palavras as tuas. Teu conceito é de pura palavra, és a própria metalinguagem na sua feição mais metafísica. Ora, o que são esses vocábulos que insistem em ecoar num sopro disforme, descontínuo, desorientado e inerte?
Sempre falas do ódio que julgas outros sentirem, e, ao mesmo tempo, do amor que dizes sentir. Porque só dizes, porque és a personificação de um elóquio. Ossos do ofício?
Por que pensas tanto em ódio e amor ao mesmo tempo? O que te faz pensar que esses aparentes opostos têm faces tão diferentes? Por que não te fazes um ser existente? A responsabilidade é uma premissa existencial, e somente os que sentem a paixão é que sabem sentir e se expressar, não mais o amor tem tanta relevância. Viver nossa condição humana é viver a paixão. É saber que o todo só adquire significado se vivido em partes. Nossas partes que simplesmente são. Eu odeio. Eu amo. Eu vivo. Eu existo. Porque sou. E a vida é.
Minha busca é pela verdade, mas receio que ela não exista, ou não seja alcançável. Ou talvez nem seja a própria verdade, talvez só exista mentira, talvez nada exista. O nada.
O nada.
Se perguntassem hoje a mim quem és diria: um dicionário, um compêndio de letras ininteligíveis, um constructo de fonemas aberrantes, é a evasão do buraco negro.
Não amas. Quem ama vive.