domingo, 8 de junho de 2014

Entre crianças e gatos




“Atirei o pau no gato-to-to, mas o gato-to-to não morreu-reu-reu (...)”. Como cantiga de roda ou de ninar, essa canção causa espanto em qualquer pensador da educação da atualidade pela letra que descreve maus tratos a um animal. A crítica é feita para alertar sobre um suposto incentivo a um comportamento agressivo por parte da criança perante os animais. Como forma de corrigir esse equívoco, criou-se uma paródia politicamente correta: “Não atire o pau no gato porque isso não se faz, o gatinho é nosso amigo, não devemos maltratar os animais, jamais!”

Muito além de querer adotar um comportamento de acordo com as regras da sociedade, devemos meditar profundamente acerca do que essa cantiga pode nos fazer questionar sobre “padrões” de educação de uma criança. Para começar, não acredito que a canção “Atirei o pau no gato” possa adentrar no inconsciente do meu filho de tal modo a corromper o seu caráter tornando-o um homem agressivo.

Percebo que há uma forte preocupação dos pais com tudo aquilo que está fora do círculo familiar: a influência dos amigos, da televisão, da moda da época, da violência das ruas, dentre outros. Por outro lado, não consigo visualizar a mesma preocupação com a influência  do próprio comportamento, isto é, comportamento dos pais, na vida dos filhos.

Quando Jesus afirmou que deveríamos “amar o próximo como a nós mesmos”, ele estava querendo dizer que o processo educativo é dialético. Não há como amar-se sem amar ao outro, assim como não como amar o outro sem amar-se. Sendo assim, se você afirma amar alguém, mas se despreza como ser humano, certamente, à luz do que Cristo falou, você não ama verdadeiramente a quem você acredita que ama.

Educar é um ato de amor. Educar é amar. Logo, para educar uma criança, preciso primeiramente me educar. E é nesse  processo auto educativo que consigo passar valores e atitudes, que, aí sim, impregnarão no inconsciente infantil da criança como modelo a ser seguido. Notem que comparações a melhor sempre são atribuídas aos pais: esse menino tem a inteligência do pai, essa menina escreve tão bem quanto a mãe! E etc, etc, etc. Mas, a comparações a menor, regra geral, não: não sei pra quem esse menino puxou!!! Diz a mãe descabelando-se perante um comportamento inadequado de um filho.

Sem querer adentrar em questões religiosas e/ou científicas, é fato que o núcleo familiar é o que exerce maior influência ou uma influência demasiadamente considerável na formação do caráter da criança. Essa é uma informação palpável que todos nós, ora pais e educadores, podemos nos apossar para formar pessoas dando o nosso melhor para isso.

Não há como pretender-se educador de uma criança sem haver autovisitação contínua e persistente em busca dos valores que atravessam as gerações: o amor, o respeito, a lealdade, a solidariedade, a honestidade, entre outros. Com efeito, o jargão “faça o que eu digo mas não faça o que eu faço”, não faz nenhum sentido porque é o nosso comportamento cotidiano que educa nossos filhos, e muito pouco nossas palavras. Claro que as palavras têm fundamental importância, mas principalmente se estiverem em sintonia com a nossa conduta.

Então, não se preocupe que cantar “atirei o pau no gato” para o seu filho não vai fazer dele um agressor, mas tenha certeza que a sua agressividade dentro de casa sim.